22.6.07


Hoje ia a banhos, como outrora se dizia, se o tempo concordasse e a minha gripe me deixasse.
Bárbara

naquelas tardes de Verão...

O sol raiava pela janela anunciando mais um fim de semana de Verão que se misturava com as doces palavras do Vinícius que tu e a mamã tanto ouviam.
Lembro-me muitas vezes da correria pela Avenida que separa a casa da praia e das brincadeiras que se conjugavam com aquelas rotinas que se amam. Muitas mais vezes lembro-me do passo ansioso e tão feminino da mamã, parecia sempre vê-la dançar no seu vestido de praia que tu tanto gostavas.
Levava sempre comigo nesses Verões de infância, o mundo calado dentro do meu balde de praia que brincava com a minha imaginação de menina que nunca mais se resumiu. Enchi-o de sonhos carregados de doçura que a pá adornava com algas e estrelas do mar e dos jogos na água que se misturavam com os teus caracóis e os teus olhos feitos de planícies verdes que não se conseguiam ver do mar.
Ainda ouço as gargalhadas largas da mamã entre acenos cheios de pormenores que cheiravam a amor.
Sou esse tempo, onde regresso tantas vezes para me enfeitar de risos e serenidade. Esse tempo onde não existem medos e o meu coração é acalentado.
- Sabes papá hoje disseram-me que a vida não é um daqueles filmes românticos que gosto, sabes aqueles que tantas vezes vimos juntos... não te preocupes eu não acreditei...

Boa Viagem.

Bárbara

21.6.07

Esconderijo VI

Viajo dentro de ti e danço com os teus sentimentos saturados o acaso da vida.
Sem lentidão escavo os afectos que sopram os desejos do teu sabor... na esperança de um dia te encontrar de novo e sabendo que este será o meu maior engano.
Bárbara

EUROPA /LARS VON TRIER









Hoje o dia merece a compra de um grande filme.

I Remember You


Was it in Tahiti
Were we on the Nile
long, long ago
say, an hour or so
I recall that I saw your smile...

I Remember You
You're the one who made
my dreams come true
A few kisses ago

I remember you
You're the one who said
I love you too
Didn't you know

And I remember too a distant bell
And stars that fell
Like rain out of the blue

When my life is through
And the angels ask me to recall
The thrill of them all

Then I shall tell them
I Remember You !

(Trumpet Solo)

(Piano Solo)

I remember too a distant bell
And stars that fell like rain
Out of the blue

When my life is through
And the angels ask me to recall
The thrill of them all

Then I shall tell them
I remember you!

If they should ask
I'll gladly tell them
I remember you!



Bárbara revive sonhos e volta a corar com Chet Baker.

17.6.07

A Cheater's Armoury



Hanne Hukkelberg

Esconderijo V





Sento o tempo e olho as letras uma a uma, espero alguma coisa, nada acontece, e continua a não acontecer...

O futuro parece não se conjugar no presente, o relógio fragilizou-se, disfarçou-se naquelas lides do quotidiano.











Imagem: Henri Cartier Bresson
Bárbara

12.6.07

Mesa de Cabeceira IV

(...) Descontrai-te. Recolhe-te. Afasta de ti todos os outros pensamentos. Deixa esfumar-se no indistinto o mundo que te rodeia. A porta é melhor fechá-la; lá dentro a televisão está sempre acesa. Diz aos outros: "Não, não quero ver televisão!" Levanta a voz, senão não te ouvem: " Estou a ler!" Não quero que me incomodem!". Não devem ter-te ouvido, com aquele barulho todo; fala mais alto, grita: " Estou a começar a ler o novo romance de Italo Calvino!" Ou se não quiseres não digas nada; esperemos que te deixem em paz. (...)
Se numa noite de Inverno um viajante
O romance começa numa estação ferroviária, ronca uma locomotiva, um arfar de êmbolo tapa a abertura do capítulo, uma nuvem de fumo esconde parte do primeiro parágrafo.(...)
Debruçando-se da escarpada falésia
Há dias em que tudo o que vejo me parece pleno de significados: mensagens que me seria difícil comunicar a outros, definir, traduzir por palavras, mas que precisamente por isso se me apresentam como decisivas. São anúncios de presságios que me dizem respeito a mim mesmo e ao mundo ao mesmo tempo: e de mim, não os acontecimentos exteriores da existência mas o que acontece cá dentro, no fundo; e do mundo não um facto singular qualquer mas o modo de ser geral de tudo. Compreendem pois a minha dificuldade em falar disto, a não ser por alusões.
" Se numa noite de Inverno um viajante" Italo Calvino

Sem título

Fuga para uma depressão anunciada.

Imagem: Filme, Marie Antoinette(2006), Sofia Coppola

Bárbara

na blogosfera / Café con libros

Na ilha em forma de cão sentado toma-se café com os melhores livros.
Bárbara

10.6.07

Anjos mulheres

As mulheres voam
como os anjos:
Com as suas asas feitas
de cristal de rocha da memória

Disponíveis
para voar

soltas...

Primeiro lentamente:
uma por uma

Depois,
iguais aos passaros

fundas...

Nadando,
juntas

Secreta:
a rasar o chão

a rasar
a fenda da lua

no menstruo:
por entre a fenda das pernas

Às vezes é o aço
que se prende
na luz

A dobrarmos o espaço?

Bruxas:
pomos asas
em vassouras de vento

E voamos

Como as asas
lhe cresciam nas coxas

diziam dela:
que era um anjo do mar

Rondo alto,
postas em nudez de ombros
e pernas

perseguindo,

pelos espaços,
lunares da menstruação

e corpo desavindo

Não somos violencia
mas o voo

quando nadamos
de costas pelo vento

até à foz do tempo
no oceano denso
da nossa própria voz

Sabemos distinguir
a dormir
os anjos das rosas voadoras

pelo tacto?

Somos os anjos
do destino

com a alma
pelo avesso
do útero

Voamos a lua
menstruadas

Os homens gritam:
– são as bruxas

As mulheres pensam:
– são os anjos

As crianças dizem:
– são as fadas

Fadas?

filigrama cintilante
de asas volteando
no fundo da vagina

Nadamos?

De costas,
no espaço deste século

Mudar o rumo
e as pernas mais
ao fundo

portas por trás
dobradas pelos rins

Abrindo o ar
com o corpo num só golpe

Soltas,
viando
até chegar ao fim

Dizem-nos:
que nos limitemos ao espaço

Mas nós voamos
também
debaixo de água

Nós somos os anjos
deste tempo

Astronautas,
voando na memória
nas galáxias do vento...

Temos um pacto
com aquilo que
voa

– as aves
da poesia

– os anjos
do sexo

– o orgasmo
dos sonhos

Não há nada
que a nossa voz não abra

Nós somos as bruxas da palavra

Maria Teresa Horta


Os Domingos com poesia fazem crescer asas...
Bárbara

9.6.07

Devaneios IV


Hoje, beijo-me mais uma vez.
Foto: Helmut Newton

8.6.07

O sonho celta de Hugo Pratt

Os mitos são eternos na medida em que são imanentes. A sua força vem-lhes do facto de poderem sempre, a qualquer momento, em todas as circunstâncias, incarnar na linguagem e constituir o quadro coerente de uma nova narrativa. Esta narrativa, tal como é apresentada, integra dados pontuais, preocupações contemporâneas de elementos antiquíssimos: constitui a actualização do mito, a sua valorização num determinado contexto, a sua abertura ao mundo real da compreensão. Ora, na nossa época, que narrativa pode dar melhor testemunho da permanência do mito do que a Banda Desenhada, expressão contemporânea, técnica popular plena da aliança da linguagem literária com as artes gráficas, e sobretudo meio ideal para a difusão do imaginário?

É neste espírito que se deve examinar a obra de um autor tão inspirado como Hugo Pratt. O seu interesse pelo mito manifesta-se desde o início da carreira. E o próprio personagem de Corto Maltese é a incarnação de uma figura mitológica, deus ou herói, de qualquer modo homem de todas as épocas e de parte nenhuma, perpétua errante num mundo em mutação, sobre cujas angústias e fantasmas ele reflecte. Com efeito, em última análise, Corto Maltese é mais uma testemunha impassível do que um actor dos dramas em que se vê envolvido. Se possui essa espécie de aura que marca os homens votados a destino excepcional, é porque o autor quis que ele fosse simultaneamente deus e homem. Como homem, está sujeito á lei comum do sofrimento, do desespero, da aventura, mas como deus desenreda o complexo emaranhado dos acontecimentos. E ele não é mortal a não ser na medida em que pode escolher a data e a hora a da sua morte, o que faz dele um ser excepcional.



Hugo Pratt, Corto Maltese As Célticas, Prefácio de Jean Markale


Imagem: O meu Herói...